Campeão BikingMan Ultra 2021

Foram 1019 km em 66 horas e 2 minutos.

Uma das provas mais desafiadoras do Ultra ciclismo mundial contou com a participação de ciclistas de diversas nacionalidades, como Bélgica, França, Alemanha, Suíça e Venezuela.

Com a participação do então 2º colocado da última edição fez com que Zogaib alinhasse na primeira fila para a largada às 5 da manhã sob garoa fina e frio. O que para muitos ali era um problema, para Zogaib se tornou uma vantagem justificada por ter encarado inúmeros treinos sob condições adversas e principalmente pelas condições vividas no desafio da Estrada Real 3 meses antes e da travessia do Brasil, então, bagagem em pedalar sob essas condições ele tinha de sobra.

Fernando Zogaib

Após os 30 km iniciais de prova a garoa vira uma forte tempestade,

Zogaib percebendo as condições duras do clima “ataca” o grupo em que estavam os líderes, inclusive o Belga e favorito para a vitória, Dimitri, no pé da Serra Velha de Campos.

Zogaib impõe um ritmo fortíssimo nos próximos km até a cidade de São Bento do Sapucaí pois sabia que dali adiante seriam 120 km de estrada de terra, que por conta da chuva forte se transformou em lama e árvores caídas.

Seguindo num ritmo muito forte chega em Joanópolis com uma velocidade média de 28 km/h e uma certa vantagem para o 2º colocado. Sua única preocupação era o fato de ter pela frente ainda 850 km para percorrer com aquela bike que ele havia recebido 15 dias antes da prova e não teve tempo hábil para realizar nenhum treino maior que aqueles exatos 150 km. Então, dali para frente não havia certezas de como seu corpo lidaria com a geometria do quadro e postura.

Fato é que mesmo após o sucesso na empreita do FKT da Estrada Real, uma prova como esta impõe uma dinâmica alucinante jamais vista e vivida por ele. Manter uma boa velocidade média, poupar o corpo, se alimentar, hidratar, fazer a navegação e manter os equipamentos eletrônicos abastecidos de baterias (faróis, lanternas, gps) ao mesmo tempo em que tem de poupar o equipamento mecânico para aguentar até o final é uma equação extremamente delicada. Nas condições climáticas que a prova estava impondo era ainda mais difícil.

Assim, os problemas foram surgindo, para eles e para os demais competidores, muitas quebras e desistências ocorreram, inclusive do Belga que era o favorito. Por outro lado, a sede dos brasileiros em fazer história era grande e Zogaib percebeu não ser o único ali almejando tal feito. Chegou a perder a liderança da prova pouco antes do PC 1 em Mogi da Cruzes quando parou para se alimentar mas retomou logo em seguida com a desistência do outro competidor por falha do equipamento que não aguentou sua pilotagem agressiva.

Zogaib foi o único atleta a enfrentar a madrugada sob forte chuva num trecho de terra bastante difícil entre Mogi e Salesópolis e ao chegar lá teve a oportunidade de dormir no chão por uma hora visto a vantagem que havia aberto.

Acordou com 3 novos competidores em seu encalço, um venezuelano e dois brasileiros, sendo um o atual campeão mundial de 24 hs e o outro o atual detentor do recorde da travessia do Brasil que fora de Zogaib 1 ano atrás.

Sem margem para erro segue impondo um ritmo forte e constante até chegar em Ubatuba, com 550 km percorridos, pouco mais da metade da prova e momento em que para efetuar a troca das pastilhas de freio dianteira e traseira. Acaba prosseguindo apenas com o freio traseiro, pois o dianteiro não foi possível reparar.

Chega em Paraty (RJ) no pc 02 com 20 km de vantagem para os dois brasileiros e com 40 de vantagem para o Venezuelano. Com uma vantagem tão pequena decide enfrentar a 2ª maior subida do país (Paraty-Cunha) a noite e sob chuva forte mais uma vez.

A privação de sono neste ponto da prova revelou uma situação que Zogaib havia lido a respeito mas jamais vivido.

Nos quilômetros finais da subida da serra o cansaço era tamanho que tirava “pequenos cochilos” enquanto pedalava. Zogaib fechava os olhos, segurava firme no guidão e contava até 10 enquanto vencia as ladeiras com inclinações de mais de 10% pedalando.

Segue por um bom tempo mantendo esta estratégia até que passa a ter alucinações! Viu Castelos no meio da floresta, placas de trânsito virarem janelas de casas e passa a lutar como jamais lutou contra o cansaço para chegar na cidade de Cunha, conseguir sinal de internet para conferir a posição dos demais competidores (cada atleta leva um rastreador fornecido pela organização onde é possível a todos o monitoramento geral da prova) e assim saber exatamente quanto tempo teria para dormir.

Fato é que após conferir a localização dos demais atletas lhe restou apenas 20 minutos de sono no chão em frente a santa casa da cidade. Partindo logo em seguida viu o dia amanhecer e a proximidade do próximo grande desafio da prova se aproximar ainda mais.

No início da tarde, Zogaib é o primeiro competidor a chegar no início da 1º subida mais difícil do país. A subida do Parque Nacional do Itatiaia. 2 mil metros verticais acumulados em 38 km de subida, sendo os últimos 17 km de terra e pedra. Ali estava um prêmio à parte na prova, realizado pelo STRAVA, um dos patrocinadores do evento. Ali seria coroado o famoso KOM, “King of Mountain”, ou “Rei da Montanha”. Nada mais do que um prêmio para o atleta que vencer o trecho no menor tempo possível.

Um belo desafio para quem ali chega com 850 km percorridos e apenas 1 h de sono em 50 horas de prova!

Na descida da serra um dos momentos mais marcantes da vida de Zogaib foi cruzar com o competidor que vinha subindo a serra em 2º lugar e após uma troca de olhares uma breve parada e um forte abraço! Fair play e a beleza do esporte demonstradas num gesto simples e muito difícil de se representar em palavras!

Como todo competidor Zogaib conseguiu calcular naquele momento a exata diferença de distância e tempo que ele havia imposto e com estes dados em mente segue firme pois considera que nenhuma vantagem é suficiente numa prova destas onde qualquer coisa pode acontecer!

E foi exatamente isso que aconteceu. Zogaib teve o taco da sapatilha solto pelo caminho obrigando-o a parar para consertar, errou a rota em 5 km na direçãO errada, tendo que retornar os mesmos 5 km e faltando apenas 40 km para concluir a prova ficou sem bateria no GPS, momento em que desvia a rota as 21 hs para buscar uma casa num bairro próximo a rodovia e carregar o equipamento.

Emoção à flor da pele com o segundo colocado a apenas 12 km atrás dele percorre os últimos 40 km pedalando em posição de sprint na bike, sem sentar praticamente nem um minuto e assim cruzar a linha de chegada como o primeiro brasileiro a conquistar tal feito em 66 hs e 02 minutos!

Após a comemoração da chegada faz questão de esperar Juliano Gehre, 2º colocado que chega 42 minutos depois e recebê-lo com um forte abraço! Uma honra ter seus limites levados além por um campeão mundial! O terceiro colocado e atual detentor do recorde da travessia do Brasil “Léo Pedalando pelo Mundo” chega apenas no dia seguinte, vencido pelo sono!

O título de rei da montanha é vencido por Zogaib que mais uma vez tem o privilégio de “viver um sonho dentro de outro sonho”!

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